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Foto do escritorPatricia Palomo

A geração perdida de rentistas

Atualizado: 9 de out. de 2020

Tenho notado um aumento das solicitações de atendimento de planejadores financeiros por parte de clientes em idades mais avançadas, idosos e pessoas bem perto da idade teto de aposentadoria.


Natural que o assunto da reforma da previdência estimule essa busca, mas os casos que tenho tido conhecimento estão causando preocupação.


Essa geração que chega agora aos 60 anos e seu entorno, não teve acesso às ferramentas e conhecimentos de educação financeira aos quais temos muito acesso hoje. Essa geração viveu a hiperinflação, estocava alimentos e outros itens no começo do mês porque sabia que no final do mês o salário não daria para comprar a mesma quantidade. Foram acostumados a gastar rápido porque o dinheiro perdia rápido seu valor. Esse mecanismo, repetido por muitos anos, causou efeitos adversos no comportamento de consumo dos indivíduos que viveram por anos nessa ciranda.


Quando a estabilidade inflacionária foi alcançada a partir do plano real, há 25 anos, essa geração teve dificuldades em dosar o consumo e poupança. Muitos, por inércia, continuaram círculo de consumo e sobrou pouco para construir o patrimônio que geraria a renda necessária para manter seu padrão de consumo após a aposentadoria.


Outros, que conseguiram de alguma forma mudar seu modus operandi em relação ao consumo e passaram a poupar parte da renda para construir seu patrimônio, sofreram de outro revés que não poderiam antecipar. Ficaram acostumados com um nível de juros muito alto por muito tempo, quase que de maneira estrutural, que criou nessa geração um viés muito perverso para os investidores: a ancoragem.

Até hoje, é comum escutar a expectativa desse público de retorno de 1% ao mês como sendo base para calculo da renda esperada sobre o patrimônio.

O lado doloroso desse viés é quando o idoso se vê com um patrimônio que ele achava que seria suficiente para manter seu padrão de vida depois da aposentadoria e as contas passam a não fechar.


Um agravante nessa situação, é que como o horizonte de investimento já não é tão longo dada a idade avançada, não é possível (ética e moralmente falando) montar uma carteira de investimentos mais arriscada para esse tipo de público. E se, infelizmente, o perfil de investimento precisa ser mais conservador, essa carteira também oferecerá taxas de retorno mais modestas.


Com essas restrições do lado do ativo, sobra fazer os ajustes do lado do passivo. Ou reduzir o padrão de vida, cortando gastos e despesas, ou conseguir outras fontes de renda como continuar trabalhando de alguma forma. Caso os ajustes não sejam feitos, o que vai acontecer no cenário atual é que as despesas correntes vão consumir parte do patrimônio, mês a mês, ano a ano, até que o mesmo se acabe, muito provavelmente antes do falecimento do indivíduo. Entristece o coração dar essa notícia e perceber o semblante de desalento e incredulidade nos rostos desses idosos.


Não sei o que o futuro nos reserva, se em algum momento voltaremos a ter o nível de juros de alguns anos atrás, o que sei é que hoje, com as taxas de remuneração dos ativos de menor risco que temos hoje, uma grande parcela dessa geração de rentistas, está perdida.





Patricia é economista, planejadora financeira certificada pelo CFP e Diretora de Investimentos da Sonata Gestora de Recursos.


As opiniões aqui expressas refletem exclusivamente a visão da autora e não se caracterizam como material de venda ou sugestão de investimentos.

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